Lançamentos: verdades e mentiras. A física explica.

por Prof. André Astro 06 mar

O russo Yakov Perelman, em seu livro “Física recreativa” conta a história de um aviador francês, na primeira guerra mundial, que estava voando a dois quilômetros do chão, quando de repente vê algo voando ao seu lado. Pensando ser um pequeno inseto ou algo do gênero, em um movimento rápido com as mãos ele pega o pequeno inseto. Qual não é a surpresa quando ele abre a mão e reconhece que não era um inseto, mas um projétil atirado por uma arma alemã.

Essa história se assemelha um pouco às histórias contadas por Rudolf Erich Raspe, escritor de “As aventuras do Barão de Munchausen”, em que o personagem principal, Friedrich Hieronymus, adorava inventar as mais descaradas mentiras de quando viveu a serviço do exército russo, em uma delas ele conta ter cavalgado em uma bala de canhão em pleno curso.

Se a história do aviador francês é verdade ou não, não vem ao caso, o importante é analisar que uma situação como essa não é impossível. O conteúdo de lançamento oblíquo no ensino da física do ensino médio e superior é uma parte importante, porque mostra um princípio físico importante que é a independência dos movimentos.

Alguns dos movimentos que vemos no nosso cotidiano são extremamente complexos, como a Terra, por exemplo, que faz mais de 10 movimentos diferentes; ou o movimento de um cavalo em um carrossel nos parques de diversões, que dependendo de onde o observador estiver poderá ver trajetórias diferentes dos cavalos.

A trajetória feita pelos cavalos em carrossel de um observador externo é algo parecido com uma senoide.

 

O movimento complexo, ou compostos, como também é chamado, foi um dos objetos de estudo do físico Galileu Galilei. Ele concluiu que todo movimento composto pode ser decomposto em movimentos mais simples. Ou seja, o movimento composto nada mais é do que a superposição de movimentos simples de modo simultâneo. O movimento do carrossel pode ser decomposto em um movimento de subida e descida em linha reta e um movimento circular em torno de um eixo, que são independentes.

O mesmo ocorre com um lançamento oblíquo, como mostrado na figura abaixo, que é nada mais é do que a composição de dois movimentos, um movimento de lançamento vertical e um movimento em linha reta horizontal que na ausência de atrito com o ar considera-se sempre como sendo um MRU.

Representação dos vetores velocidades em um lançamento oblíquo. Os vetores são independentes entre si, porém a sua soma resulta no movimento composto (oblíquo).

Com isso em mente, pode-se considerar que a história do aviador francês não é tão impossível quanto possa parecer à primeira vista. Tendo como base, uma das armas mais utilizadas pelo exército alemão, a espingarda Gewehr 98, a velocidade de saída do projétil pode chegar a 870 m/s (Tendo isso em mente, pode-se considerar que a história do aviador francês não é tão impossível quanto possa parecer à primeira vista. Tendo como base, uma das armas mais utilizadas pelo exército alemão, a espingarda Gewehr 98, a velocidade de saída do projétil pode chegar a 870 m/s (~ 3132 Km/h), essa velocidade, dependendo do ângulo de lançamento é decomposta em suas componentes no eixo x e no eixo y, componentes estas que são independentes entre si, como descobriu Galileu. O caso é, o movimento na horizontal, não se mantem com velocidade constante por causa do atrito com ar, diminuindo sua velocidade, enquanto o movimento na vertical além da resistência do ar, ainda sofre a ação da própria força da gravidade, realizando um movimento ascendente retardado. 3132 Km/h), essa velocidade, dependendo do ângulo de lançamento é decomposta em suas componentes no eixo x e no eixo y, componentes estas que são independentes entre si, como descobriu Galileu. O caso é, o movimento na horizontal, não se mantem com velocidade constante por causa do atrito com ar, diminuindo sua velocidade, enquanto o movimento na vertical além da resistência do ar, ainda sofre a ação da própria força da gravidade, realizando um movimento ascendente retardado.

Gewehr 98, arma amplamente utilizada pelos alemães na primeira guerra mundial.

 

Um avião francês, na época, poderia chegar a uma velocidade aproximada de 230 Km/h. Então, se a velocidade na horizontal do projétil,  ao final do seu movimento ascendente, for algo próximo a 230 Km/h, o piloto veria o projétil ao seu lado como se ele estivesse parado no ar. Além disso, para não queimar a mão, muito provavelmente ele estaria usando luva, pois a bala da espingarda esquentaria bastante pelo atrito com o ar.

Um raciocínio parecido pode ser colocado em um terrível problema, embora recorrente no Brasil, que é a chamada bala perdida. Dependendo do ângulo em que um atirador aponta uma arma e atira, uma bala pode atingir um alvo indesejado tanto na subida quanto na descida de forma mortal. Um projétil que é atirado verticalmente para cima, com uma velocidade inicial de 1040 km/h, como um projetil de 38, subirá até uma altura aproximada de 750m e cairá acelerando. Por causa da resistência com o ar o projetil voltará ao chão com uma velocidade vertical próxima de 250 Km/h, o que pode acontecer, por ação do vento, a uma distância de centenas de metros do local onde o tiro aconteceu. A situação só piora se o disparo acontecer com armas mais potentes como fuzis, por exemplo, ou se o ângulo de disparo for diminuído.

A percepção sobre a composição de movimentos e o estudo de lançamentos são parte fundamental da física, não apenas para a mecânica, mas na ondulatória, na eletricidade e no magnetismo. O kit de estudo de lançamentos da Azeheb é extremamente completo e eficiente. Compostos de sensores para medida de tempo, mini canhões lançadores de projéteis, e muitas ideias e possibilidades de estudo, o kit é capaz de mostrar a composição de movimentos, e fazer um estudo detalhado sobre lançamentos horizontais e oblíquos, conservação de energia, conservação de momento linear e até sobre pêndulo balístico.

Foto retirada de um dos manuais do Kit Lançador de Projéteis.

Enfim, embora não saibamos se é verdadeira ou não a história do aviador francês, como foi discutido, é possível que algo assim aconteça. Já, cavalgar em uma bala de canhão em pleno curso, pode-se dizer que é mais uma das grandes inverdades, porém superinteressantes, histórias contadas pelo barão de Munchausen.

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